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quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Antagonismo econômico das Américas: o que causou?

 

 

RESUMO


A pobreza da América Latina e a riqueza da América do Norte são muitas vezes explicadas a partir de teorias simplistas e irreflexivas. Cria-se a imagem de uma América Dominante, e outra que foi dominada ao longo do tempo, sem a oportunidade de se desenvolver economicamente.Além disso, muitas vezes a culpa pela pobreza latino-americana é atribuída a potências econômicas, como por exemplo, os Estados Unidos. Porém, novas análises têm surgido, como a do Professor Paulo Roberto de Almeida, que com base em estudos mais aprofundados,refuta algumas explicações óbvias, procurandoevidenciar os reais motivos do subdesenvolvimento dos países da América Latina. Esse artigo propõe situar os principais motivos destacados pelo Professor Paulo Roberto de Almeida, no âmbito político, econômico e social, bem como apresentar algumas das principais teorias desenvolvidas por estudiosos ao longo do tempo, no que diz respeito à pobreza latino-americana.


Palavras-Chave: América Latina – América do Norte – Antagonismo Econômico



Esse é um trabalho sobre a abordagem do Professor Paulo Roberto de Almeida, baseado em sua vídeo-aula e artigo intitulados “Porque a América Latina é pobre e a América do Norte é rica? ”, onde ele apresenta motivos de âmbito político, econômico e social, e refuta algumas colocações já conhecidas que diziam explicar a pobreza latino-americana, e a riqueza norte-americana. 
No mundo acadêmico as explicações mais difundidas são as mais simplistas e superficiais, como por exemplo, a de Colônias de Exploração e Colônias de povoamento. Segundo essa teoria, algumas colônias serviram apenas como áreas para enriquecer a metrópole, ou seja, eram apenas de exploração. Já nas colônias de povoamento, o objetivo não seria tão somente enriquecer, mas também habitar e povoar a nova terra, o que levaria a um desenvolvimento da colônia. Seguindo o mesmo raciocínio, as colônias ibéricas seriam as de exploração, isto é, países como Peru, Brasil e México seriam subdesenvolvidos porque seus colonos só tinham a intenção de explorá-los enquanto colônia. Já as colônias anglo-saxônicas seriam as de povoamento, o que explicaria o grande desenvolvimento de países como os Estados Unidos e Canadá (KARNAL, 2013, p. 13).
Essa sem dúvidas é uma teoria irrefletida, que resume consequências causadas por escolhas e posicionamentos de uma certa região ao longo da história, à uma atitude colonizadora. E não para por aí. Há uma outra ideia associada a esta que julga a “pobreza” de certas regiões com base na qualidade dos colonos. Vejamos:

         Para as colônias de exploração as metrópoles enviariam o “refugo”: aventureiros sem valor que chegariam aqui com olhos fixos na cobiça e no desejo de ascensão. As colônias de povoamento receberiam o que houvesse de melhor nas metrópoles, gente de valor que, perseguida na Europa, viria resignada com seus bens e cultura para o Novo Mundo (KARNAL, 2013, p.14).

           Ou seja, essa é uma colocação totalmente pretensiosa, que explica a atual condição de um país a partir de características do colonizador como ambição, riqueza, cultura, e até mesmo raça, pois alguns consideram que os ingleses seriam uma raça mais desenvolvida. Em suma, a explicação se resume na seguinte frase: “Somos pobres porque fomos explorados por uma gentalha medonha! Os Estados Unidos são ricos porque tiveram o privilégio da colonização de alto nível da Inglaterra” (KARNAL, 2013, p.14).
Autores como Viana Moog e Richard Morse trouxeram novas respostas se baseando em diferentes fatores do processo de construção histórica dessas diferentes Américas como religião, cultura e geografia. Porém, não nos prenderemos em analisar a visão dada por esses autores, pois como já foi antes citado, o referencial teórico para a produção textual deste artigo baseia-se no olhar fornecido por Almeida. Vejamos então, de forma detalhada, a resposta dada pelo professor à pergunta que não quer calar: Porque a América Latina é pobre e a América do Norte é rica?


2 DESENVOLVIMENTO

Como já se sabe, a comparação comum feita entre América do Norte e América Latina é um tanto maniqueísta. Dá se a entender que ambas estão em uma luta constante, onde de um lado do ringue temos “o terrível império americano, conquistador e opressor de outros povos” e do outro lado “o simpático e pobre cidadão latino-americano oprimido”.Para que não se caia nesse conto reducionista, é preciso analisar o porquê de América Latina ter se atrasado tanto no seu desenvolvimento.

2.1 Explicações para o atraso econômico da América Latina

O estado natural da humanidade é um estado de baixo crescimento e de pobreza, até porque o progresso não é algo inerente às sociedades. A poucos séculos atrás o crescimento econômico se dava de forma lenta. É com a Revolução Industrial, caracterizada pela série de invenções ocorridas no século XVIII, que vai acontecer um aumento da produtividade. Pela primeira vez foi possível proporcionar um crescimento autossustentado, que não se esgotava com o aumento populacional (LANDES, 2003, p.207). Até o século XVIII a desigualdade era entre a Europa Ocidental e o resto do mundo. Dessa forma, o mundo dos últimos cinco séculos é o mundo criado pela Europa, que dominou metade do mundo. Abaixo temos a famosa caricatura de James Gillray que exemplifica bem este fato.

Século XVIII: O mundo sendo dividido
                                        por Inglaterra (Pitt) e França (Napoleão).
                                                                 Fonte: Wikipédia

Posteriormente os Estados Unidos iniciam seu processo de industrialização, e substituem o então Império Britânico no século XX, porém, é importante destacar que a dominação americana não é a mesma dominação britânica do século XIX, as teorias conspiratórias são, sem dúvidas, exageradas. A maioria dos intelectuais latino-americanos veem os Estados Unidos como explorador, porém o número de “oprimidos” e desempregados- de toda a parte do mundo- que querem ir para os Estados Unidos só aumenta. E nesse quesito, “o Brasil se tornou de importador de mão-de-obra, um exportador de sua própria força de trabalho, inclusive a mais especializada”(ALMEIDA, 2015, Vídeo-Aula).
O Império Americano teve início, segundo alguns historiadores, em 1898 com a guerra Hispano-americana, quando os Estados Unidos derrotam a Espanha, e tomam o Porto Rico e as Filipinas. Já no períodoapós a Segunda Guerra Mundial, eles ascendem,aproveitando-se do fato que a Europa e a Ásia estavam destruídas pela guerra, e se tornam a grande potência econômica. Atualmente o Império Americano pode ser considerado decadente, pois não exerce tanto poder quanto antes.
Ao invés de se atribuir a culpa pela pobreza da América Latina aos Estados Unidos e outras potências, deve se levar em conta que o Império Americano é recente, e que enquanto o mesmo se industrializava, a América latina e outras regiões periféricas passam a se especializar na exportação de produtos primários.Isto é, o atraso da América Latina para aderir as novas tecnologias proporcionadas pela Revolução Industrial, levou países que apresentavam condições favoráveis para a plantação e transformação do algodão a se tornarem importadores de tecidos de algodão.

Ou seja, tanto o Brasil quanto o Egito e a Índia eram grandes produtores e exportadores de algodão. Mas no cômputo final entre exportações do produto cru, ou seja, algodão não processado, e exportações e importações totais de produtos de algodão, isto é, fios, telas e roupas, o saldo era nitidamente desfavorável para países [como China, Índia, Argentina, Egito e Brasil]. (ALMEIDA,2015, p.5)

Além disso, o que incitou esse grande atraso econômico e industrial foi a “especialização”, ou seja, os países latino-americanos se concentravam na produção e exportação de poucos produtos primários.
Outro motivo que provocou o atraso da economia latino-americana foi o protecionismo adotado por alguns países na tentativa de promover suas indústrias. Apesar de os Estados Unidos, que hoje é um país avançado, ter adotado políticas protecionistas, não é de se comparar com a América-Latina. Melhor dizendo, durante toda a fase de industrialização no século XIX, os países da América Latina aumentaram as tarifas na importação de produtos manufaturados, além de proibir a importação de produtos com similar nacional. Nesse contexto, o Brasil era o país de mais alta proteção tarifária do mundo. A tabela abaixo, utilizada pelo Professor Paulo Roberto (2015, p.7), demonstra bem esses resultados:


 Tarifas médias ad valorem aplicadas aprodutos manufaturados, 1913
 Tarifas protecionistas
Tarifas “normais”
Brasil
50-70
França; Suécia
20
Colômbia
50-60
Nova Zelândia
15-20
México
40-50
Itália
18
EUA
44
Áustria-Hungria
18
Espanha
41
Austrália
16
Japão
25-30
Dinamarca
14
Argentina
28
Alemanha
13
Canadá
26
Grã-Bretanha
0
Fonte: Liga das Nações, 1927: 15


Quando utilizado de forma exagerada, o protecionismo industrial torna o mercado interno totalmente dependente da produção nacional, que termina estacando por não precisar competir com os mercados internacionais. Dessa forma, dificilmente um país que adota uma política protecionista vai se adequar aos graus de avanço tecnológico na qual estão expostos aqueles que se inserem no mercado internacional.


2.2 Diferenças básicas entre países latino-americanos e países avançados

Em sua análise Almeida evidencia também os fatores culturais como pontes relevantes nesse antagonismo. Se tratando de educação, os dados quantitativos revelam que os países latino-americanos chegaram mais de um século depois às taxas de matrícula dos líderes em educação, isso apenas em números, sem levar em consideração a qualidade do ensino. Além desse fator, existe também a baixa qualificação da mão-de-obra dos países latino-americanos com respeito aos Estados Unidos e aos demais países avançados.
Porém, vale ressaltar que nem sempre a América Latina teve descrédito quanto ao progresso de sua economia. Em 1960, um estudioso de processos de desenvolvimento econômico chamado Gunnar Myrdal afirmou que a Ásia continuaria sendo sinônimo de miséria insuperável durante muito tempo, enquanto que os países da América Latina, caso adotassem as políticas socialistas usadas pela Índia, se tornariam países desenvolvidos. Mas, como podemos notar, o que aconteceu foi exatamente o oposto. Nos últimos 40 anos a Índia e a América Latina estagnaram, ao passo que a Ásia se desenvolveu economicamente a partir da inserção na economia mundial, “baseada no setor privado e nos investimentos estrangeiros, em substituição à proteção nacional e o controle do Estado” (ALMEIDA, 2015, p.11). Inclusive, a Índia só conseguiu maior crescimento quando adotou essa política asiática.
Ao ressaltar esses fatos, já podemos notar o quanto a explicação de “exploração imperialista” é simplista. Isso não quer dizer que não haja realmente uma exploração, mas sim que não se deve reduzir o motivo da pobreza e atraso da América Latina ao Império Americano. Segundo Paulo Roberto de Almeida, desde o século XIX que a América Latina vem fazendo “tudo errado”. A baixa qualificação da mão-de-obra, o pouco investimento em educação e os excessivos endividamentos externos, são fatores que devem ser levados em conta ao se tratar do atual antagonismo econômico existente entre América Latina e América do Norte.
Além desses três pontos enfatizados acima, outra atitude considerada inapropriada para a América Latina foi na esfera da Política Fiscal, pois foi emitido muito dinheiro, e gastou-se além do que se arrecadava. A questão da corrupção política também não deve ser passada em branco, além do fato de o Brasil ter sido industrializado com base no modelo cepalino de Raúl Prebisch. A Ásia se diferenciou então por ter buscado “no comércio exterior e na busca de tecnologias estrangeiras, abrindo-se ou associando-se a empresas multinacionais [...] o resultado foi o crescimento contínuo [...]” (ALMEIDA, 2015, p.11).
A liderança política da América Latina também se diferencia das lideranças de países mais avançados, pois ela busca sempre a “igualdade” e a “justiça social”, enquanto que os países avançados se desenvolveram não com “esmolas”, mas sim por terem se integrado à economia mundial.Apesar de a América Latina ter obtido alguns progressos como a diminuição da pobreza e das desigualdades, é preciso deixar claro que isso foi conquistado à base de altos imposto sobre a população mais pobre.
A comparação com os países asiáticos se insere aqui exatamente para não surja o argumento de que não se pode comparar a América Latina com a América do Norte pois ambas possuem diferentes processos históricos de colonização, independência e industrialização. Os países asiáticos, assim como os latino-americanos, foram afetados pelas crises financeiras internacionais, o que acontece com a América Latina é que ela, de fato, não teve um projeto efetivo de desenvolvimento, “durante a maior parte da história contemporânea foi estatista, protecionista e dirigista” (ALMEIDA, 2015, p.15).

3. CONCLUSÃO

Enfim, a América Latina até que poderia ter conquistado melhores taxas desenvolvimento econômico e social, caso tivesse estabelecido um conjunto de políticas e instituições voltadas para o crescimento, mas o que ela fez foi se perder na instabilidade econômica e social. Atitude essa que despertou golpes de Estado, revoluções e até mesmo guerras civis.
O que aconteceu com os países latino-americanos, foi que eles “estacionaram” diante do mundo em desenvolvimento.Um capitalismo para ser bem organizado depende de uma boa liderança, e isso tem variado muito nos diferentes países da América Latina, pois temos tanto países que procuram se inserir no mercado internacional, como é o caso do Chile, como também temos outros que são saudosistas, ou seja, procuram conter esse processo, nesse modelo de liderança se encaixa muito bem o Brasil e a Argentina. Ainda temos os países “esquizofrênicos”, como a Venezuela e Cuba, que são aqueles que “pretendem fazer girar para trás a roda da história, como se fosse realmente possível impedir processos econômicos se continuar avançando” (ALMEIDA, 2015, p.18).
Como foi dito inicialmente, o objetivo deste artigo foi desconstruir, segundo a análise do Professor Paulo Roberto de Almeida, alguns estereótipos maniqueístas relacionados aos países norte-americanos, e apresentar possíveis causas para a pobreza da América Latina. Não se pode analisar de forma odiosa países como os Estados Unidos pelo simples fato de eles terem conseguido desenvolver políticas de desenvolvimento e nós não. Deve-se reconhecer, que “tanto em seus êxitos quanto em seus fracassos e incertezas, a experiência norte-americana interessa à humanidade inteira (...) é a garantia de liberdade para numerosos países” (REMOND,1989, p.125).
Após essa análise, podemos concluir que a América Latina se confundiu e ficou para trás por conta própria, independentemente das crises financeiras ou da “exploração imperialista” americana. E como ousadamente já afirmou Leandro Karnal em seu livro (2013, p.9):

Quem está por cima desperta críticas que mostram tanto os pontos que consideramos negativos dos vitoriosos, como o que gostaríamos de ter e não temos. As críticas, às vezes, são uma das maneiras transformadas da inveja.



ANTAGONISM ECONOMIC OF THE AMERICAS: WHAT CAUSED?


ABSTRACT


Poverty in Latin America and the wealth of North America are Often Explained from simplistic theories and unthinking. It creates an image of a Dominant America, and another what was dominated over time, without the chance to develop economically. In addition, Often to blame for Latin American poverty is attributed to economic powers, such as the United States. However, new Analyzes have emerged, such as teacher Paulo Roberto de Almeida that based on further studies, refutes some obvious explanations, looking for evidence the real Reasons for the underdevelopment of Latin America. This article Proposes to place the main Reasons highlighted by teacher Paulo Roberto de Almeida, in the political , economic and social , as well as presenting some of the main theories developed by scholars over time , with regard to Latin American poverty .


Keywords: Latin America - North America - Economic Antagonism


REFERÊNCIAS


ALMEIDA, Paulo Roberto. Por que a América Latina é pobre e a América do Norte é rica?. Hartford, 2015.


ALMEIDA, Paulo Roberto. Vídeo-Aula:Por que a América Latina é pobre e a América do Norte é rica?. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=DFzchiyyMm8>. Acesso em: 04 jun. 2015.


KARNAL, Leandro. Estados Unidos: a formação da nação. IN: ___. As comparações incômodas.São Paulo: Contexto, 2013. p.13-18.


LANDES, David. Riqueza e pobreza das Nações: por que algumas são tão ricas e outras são tão pobres. IN: ___. A natureza da revolução industrial.Campus,2003. p.206-221.


REMOND, René. História dos Estados Unidos. São Paulo: Martins Fontes, 1989.




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Sara S. de Oliveira
Acadêmica de História
Paraíba, Brasil